Resumo
A cirurgia de reposicionamento labial é um dos recursos usados na odontologia para correção de sorrisos com grande exposição de gengiva, como a toxina botulínica. Esse método foi introduzido na literatura pela área da medicina por meio dos cirurgiões plásticos Rubinstein e Kostianovisy em 1973 (RUBINSTEIN; KOSTIANOVSKY, 1976). Entretanto, em 2006 essa técnica foi modificada por Rosenblatt e Simon para ser utilizada na odontologia, descrevendo a técnica a partir da remoção de uma banda de mucosa do vestíbulo superior e reposicionando o lábio superior em direção coronal. Dessa maneira, foi possível restringir a elevação do lábio superior e consequentemente reduzir a quantidade de gengiva exposta (PANDURIC, 2014). Após a introdução na odontologia, novas publicações reforçaram a importância estética de haver uma proporção entre a quantidade de exposição dos dentes e gengiva da posição dos lábios e a sua relação com o sorriso para alcançar uma harmonia facial (GERON; ATALIA, 2005; HUNT et al., 2002; MACHADO, 2009).
Um sorriso considerado estético normalmente apresenta uma exposição de gengiva de, aproximadamente, 40% a 50% do comprimento dos dentes superiores anteriores preenchendo completamente as ameias proximais, medindo da margem gengival até a ponta da papila. A exposição exagerada de gengiva ao sorrir é uma condição inestética ao conhecida como sorriso gengival. A quantidade de gengiva exposta é determinada pela distância vertical do ponto mais apical da margem gengival dos incisivos centrais superiores até o ponto mais baixo do lábio superior acima desses dentes. Dessa forma, os sorrisos que apresentam uma exposição gengival acima de 3 mm caracterizam sorrisos gengivais (TJAN; MILLER; THE, 1984; KER et al., 2008; KOKICH; ASUMAN KIYAK; SHAPIRO, 1999; GARBER; SALAMA, 1996; MCLAREN; CAO, 2009).
O sorriso gengival pode ser causado por atrito dos bordos incisais, anquilose devido a algum trauma durante o período de crescimento, apinhamento severo, ou migração retardada do tecido gengival. Dentre os meios de correção, as margens gengivais podem ser niveladas por meio da ortodontia ou por cirurgia periodontal, dependendo da linha labial, da altura da coroa e do nível gengival do dente adjacente. Essa condição afeta uma significativa parcela da população, destacando mulheres entre 20 e 30 anos de idade. Entretanto, o tônus muscular dos lábios tende a diminuir com a idade, resultando em uma gradativa diminuição na exposição gengival, culminando em um decréscimo na sua incidência (BAYRAKTAR; HOCKENBERGER, 2001; SILVA et al., 2013; PAUL, 2001; ALAMMAR et al., 2018).
Técnicas cirúrgicas (reposicionamento labial)
O sorriso gengival pode ter diversas causas, e a escolha do tratamento vai depender da etiologia, ou o conjunto delas apresentado pelo paciente. Existem diferentes formas de corrigir o sorriso gengival, de forma que o cirurgião-dentista pode optar por técnicas menos invasivas e de pequena duração, como aplicação de toxina botulínica ou ácido hialurônico, ou por técnicas cirúrgicas que proporcionem resultados mais duradouros e estáveis, como a cirurgia ortognática, aumento de coroa clínica e o reposicionamento labial. Quando o paciente apresenta uma hipermobilidade do lábio superior durante o sorriso como causa principal, o método mais indicado para a correção é o reposicionamento labial (LEE et al., 2004; EZQUERRA et al., 1999; PANDURIC, 2014; GUPTA et al., 2010). Entretanto, essa etiologia geralmente está associada a um crescimento vertical da maxila, denotando que em alguns casos a técnica de reposicionamento labial promoverá uma redução do excesso de exposição gengival, porém sem posicionar os lábios com perfeição. Isso ocorre porque a cirurgia objetiva limitar a tração muscular do sorriso, a partir da remoção de uma banda de mucosa, reduzindo a profundidade do vestíbulo superior. A quantidade de mucosa a ser removida baseia-se na regra do dobro da quantidade de gengiva aparente. Essa remoção pode ser realizada com a utilização de lâminas de bisturi, bisturi elétrico ou cirurgia a laser. Entretanto, a presença de uma faixa estreita de gengiva inserida pode dificultar o desenho do retalho e a estabilização dos resultados, sendo uma limitação para a cirurgia de reposicionamento labial (ROSENBLATT; SIMON, 2006).
Após a descrição da cirurgia pela primeira vez em 1973, a técnica sofreu sucessivas modificações e aprimoramentos ao longo dos anos. Dessa maneira, em 1978 foi relatado o desprendimento dos músculos da estrutura óssea em casos de lábio superior curto. Em 1983, surgiu uma nova proposta mais invasiva com ressecção parcial bilateral do músculo elevador do lábio superior chamada de miotomia. Entretanto, a técnica não obteve resultados duradouros, além de apresentar grande morbidade e possibilidade de parestesia (FUDAH, 2019; MISKINYAR, 1983).
Diante da recorrência do sorriso gengival, seis meses após a miotomia, Ellenbogen e Swara (1984) sugeriram o uso de um espaçador aloplástico (silicone) ou autógeno (cartilagem) para impedir que os cotos do músculo fossem rearranjados no local original. Outros autores propuseram a associação da miotomia com as técnicas existentes de dissecção subperiosteal da gengiva da maxila e frenectomia. Nessa técnica combinada, por meio de um acompanhamento de 6 meses, os autores concluíram que o rearranjo dos músculos ocorre em uma posição mais baixa que a original, não sendo necessário o uso de um espaçador. Ademais, ao comparar as técnicas convencionais de reposicionamento labial e o reposicionamento com miotomia, após 12 meses, os pacientes que realizaram a miotomia apresentavam menor exposição gengival, melhor estabilidade e maior satisfação estética com os resultados (TAFIC et al., 2018).
Recentemente, a toxina botulínica se tornou uma opção de tratamento para a correção do sorriso gengival, sendo um artifício não cirúrgico, mais conservador e imediato. A injeção em músculos hiperativos com unidades adequadas da substância proporciona uma redução da atividade muscular, relaxando os lábios e diminuindo a tração. A melhoria alcançada é quase imediata. No entanto, a duração dos efeitos varia entre 3 e 6 meses, tendo uma durabilidade relativamente pequena, sugerindo a necessidade de nova aplicação num intervalo de tempo pequeno. Essa curta duração da toxina botulínica é a principal desvantagem da técnica (MEUNIER; SCHIAVO; MOLGO; 2002; JANKOVIC; BRIN, 1997).
A evolução dos fios de sutura aprimorou os protocolos técnicos e contribuiu para melhores resultados cicatriciais. O fio de poliéster consiste em um multifilamento trançado disponível em formas planas e revestidas, sendo um dos fios não metálicos mais resistentes disponíveis no mercado. Esse fio pode ser caracterizado por diferentes revestimentos, como polibutilato, teflon e silicone que atuam na diminuição da resistência ao arrastar o fio por meio do tecido (SARVER; ACKERMAN, 2003; QI et al., 2015; BAYRAKTAR; HOCKENBERGER, 2001). O fio de poliéster é produzido a partir de um polímero de tereftalato de etileno, obtido a vácuo em elevada temperatura. É preparado a partir de fibras de alto peso molecular e cadeia longa. Suas propriedades proporcionam boa resistência tênsil, reação tecidual moderada, fácil manuseio, além de excelente travamento do nó.