Resumo
Nos seres humanos, a dentição decídua está constituída por vinte dentes com características similares aos seus sucessores permanentes, tendo como funções: manter espaço para erupção dos permanentes, auxiliar no desenvolvimento dos ossos e músculos faciais e proporcionar aos dentes permanentes, uma oclusão satisfatória (VANTINE; CARVALHO; CANDELÁRIA, 2007).
Erupção dentária é o processo que envolve todos os movimentos dos germes dentários, desde as etapas iniciais do seu desenvolvimento, até a exteriorização dos dentes na cavidade bucal, bem como os movimentos posteriores para compensação de desgastes oclusais e de mesialização (MARKS; SCHROEDER, 1996; CIAMPONI; SUGA; NASSIF, 2009). Trata-se, portanto, da translocação do dente em desenvolvimento através do osso, por um metabolismo ósseo coordenado: reabsorção na direção da erupção e formação na direção oposta (GINANI; VASCONCELOS; BARBOZA, 2011). A oclusão dentária será, então, tanto do ponto de vista do tempo, quanto da posição de cada dente no arco, o reflexo de um todo (forma e função) sincronizado e interrelacionado, que quando adequadamente desenvolvido, repercutirá em uma face harmoniosa e saudável (CIAMPONI; SUGA; NASSIF, 2009; TEIXEIRA et al., 2015). A cronologia de irrupção dos dentes na cavidade bucal (quadro 1) é relativamente variável, sendo considerada normal uma antecipação ou atraso de até 6 meses em relação à média, geralmente preservando-se a sequência (CIAMPONI; SUGA; NASSIF, 2009).
Segundo TEIXEIRA et al. (2015), fatores de origem local, ambiental ou genética, podem influenciar o processo de erupção dos dentes permanentes. Perda precoce, erupção tardia ou ausência do sucessor permanente, más formações em geral, dentes supranumerários, traumas, tumores, lesões de cárie, inflamações apicais e o estado nutricional do indivíduo podem alterar o curso normal da cronologia de erupção (VANTINE; CARVALHO; CANDELÁRIA, 2007). Nestes casos, um dente decíduo pode ser mantido além do tempo normal de sua esfoliação, resultando em uma maior vida útil para esse dente. Esta condição, conhecida como “persistência” (AKTAN et al., 2012), tem como causa mais comum a ausência de desenvolvimento do sucessor permanente (ROBINSON; CHAN, 2009). Porém, estudos sugerem que, em casos de impactação ou migração intraóssea do dente sucessor (JOSHI, 2001; SHAPIRA; KUFTINEC, 2003; AKTAN et al., 2008), embora ele esteja presente, não consegue entrar em erupção, deixando o dente decíduo in situ (ROBINSON; CHAN, 2009). Assim, um dente retido, com coroa, raízes e osso alveolar em bom estado, pode oferecer a um paciente adulto muitos anos de funcionalidade. Porém, esta persistência também pode levar a alguns problemas clínicos, como periodontite, lesões de cárie profundas e anquilose (AKTAN et al., 2012), além da possibilidade de causar danos à oclusão do paciente (TEIXEIRA et al., 2015).
É essencial que todos os pacientes com dentes decíduos retidos sejam encaminhados para uma minuciosa avaliação com uma equipe multidisciplinar, incluindo pediatra, ortodontista e especialista em estética. Após a análise de questões gerais, tais como saúde bucal e geral do paciente, sua motivação e expectativas em relação ao caso em questão, uma avaliação local deve ser feita. Clinicamente, deve-se basear na forma coronal, cor e integridade estrutural dos dentes decíduos; nível gengival do dente e sua relação com o plano oclusal dos dentes permanentes; tamanho do espaço interoclusal, que pode ser reduzido se o dente decíduo permitiu extrusão do antagonista (ROBINSON; CHAN, 2009).
Muitos dos problemas podem ser superados com a intervenção ortodôntica e/ou cirúrgica (ROBINSON, CHAN, 2009). Em outros casos, especialmente para segundos-molares decíduos, quando não é possível fechar o espaço, torna-se necessário deixa-lo in situ e acompanhar o paciente (BJERKLIN et al., 2008). Entretanto, há poucos estudos que acompanharam, a longo prazo, até sua idade adulta, um grande número de pacientes com retenção prolongada de dentes decíduos, bem como aqueles que explicam as condições necessárias para que ela ocorra.