Resumo
Os distúrbios do desenvolvimento do esmalte podem ser de causas hereditárias, amelogênese imperfeita, adquiridas por causas conhecidas, como a fluorose ou dentes de Turner, e ainda por etiologia desconhecida (idiopática), como por exemplo, primeiros molares permanentes com defeitos de mineralização (WEERHEIJM, 2003). Essa última condição é caracterizada por defeitos qualitativos dos tecidos dentários e identificada visualmente pela alteração na translucidez do esmalte, sugerindo o nome de Hipomineralização Molar-Incisivo (HMI) (WEERHEIJM; JALEVIK; ALALUUSUA, 2001; WEERHEIJM et al., 2003).
O esmalte dos molares apresenta aspecto clínico poroso e aparência de “queijo holandês envelhecido” ou giz, por isso, foi denominado de “molar de queijo” (AMERONGEN, 1995). Sua opacidade é demarcada por bordas com coloração que varia do branco ao castanho, distinguindo-se do esmalte normal e com acometimento principal dos dois terços oclusais da coroa, tanto nos molares quanto nos incisivos. A fratura do esmalte pode ocorrer após a erupção ou sob forças mastigatórias, levando à sensibilidade dentária e ao aparecimento de lesões cariosas. A HMI pode apresentar-se apenas em uma hemiarcada, enquanto no lado contralateral os dentes encontram-se hígidos. (KOCH et al., 1987; ALALUUSUA et al., 1996, 1999; JÄLEVIK; NORÉN, 2000; LEPPÄNIEMI et al., 2001; WEERHEIJM et al., 2001; HÖLLTÄ et al., 2001).
De acordo com estudos epidemiológicos realizados em países como China, Brasil, Iraque, Alemanha e Espanha a média de prevalência de HMI varia entre 2,5% e 40,2% (CHO; KI; CHU, 2008; SOVIERO et al., 2009; COSTA-SILVA et al., 2010; GHANIM et al., 2012; JEREMIAS et al., 2013; GARCIA-MARGARIT et al., 2014; PETROU et al., 2014).
A etiologia da HMI pode estar associada à complicações durante o período de mineralização de primeiros molares e incisivos permanentes, a qual tem início no fim do período gestacional e sua conclusão se dá durante os primeiros quatro anos de vida. Assim, anormalidades neste período estão relacionadas com a ocorrência de HMI (BEENTJES; WEERHEIJM; GROEN, 2002). Alguns estudos indicam que a presença de defeitos na formação do esmalte é maior em regiões em que o esmalte é espesso (NEEDLEMAN et al., 1991; JÄLEVIK et al., 2001), sugerindo que essas regiões necessitam de maior atividade metabólica dos ameloblastos produzindo rapidamente o esmalte, se tornando ao mesmo tempo, vulnerável a qualquer injúria. Ainda segundo Needleman et al. (1991), um distúrbio metabólico severo pode afetar todos os dentes e superfícies, porém, caso seja moderado, pode afetar a atividade dos ameloblastos mais ativos ou acelerar a maturação do esmalte. Alguns ameloblastos podem se recuperar frente a injúria, mas acabam agindo de maneira deficiente. Geneticamente, uma injúria isolada, muitas vezes, não é suficiente para desenvolver um fenótipo específico, entretanto dois ou mais fatores podem levar a uma mutação em um alelo funcional anterior e, por conseguinte, a um fenótipo bem conhecido (DIMARAS et al., 2012). Evidências de fatores associados à HMI incluem condições multifatoriais (sistêmicas e ambientais), tais como, problemas respiratórios, complicações pré-natais, baixo peso ao nascimento, desordens metabólicas de cálcio e fosfato e doenças da infância acompanhadas de febre alta (ALALUUSUA, 2010) nos quatro primeiros anos de vida têm risco aumentado de apresentar a condição. Certos poluentes ambientais, como a dioxina e o furano, também podem aumentar o risco de se desenvolver a HMI via leite materno, o uso de mordedores, chupetas e mamadeiras de plástico também são fatores pertinentes. Há algumas evidências para vincular a desnutrição infantil a um aumento da prevalência de defeitos do esmalte, mas ainda é necessária investigação para confirmar qualquer relação direta. Mais recentemente, fatores como estresse psicológico materno, exposição freqüente a exames de ultra-som durante o último trimestre de gestação foram reportados (GHANIM et al., 2013), ou até mesmo a exposição ambiental, em indivíduos com uma maior suscetibilidade genética, podem estar relacionados a distúrbios do esmalte (CROMBIE; MANTON; KILPATRICK, 2009).
A conduta adequada de tratamento a ser realizado nos molares afetados é de suma importância, pois estes podem apresentar sinais de opacidade e de perda de esmalte pós-eruptiva, levando à sensibilidade e comprometimento estético (RUSCHEL et al., 2006). Restaurações com resina composta podem ser realizadas em dentes com pouco comprometimento com remoção de todas as lesões opacas hipomineralizadas do esmalte (WILLIAM; MESSER; BURROW, 2006; FERNANDES; MESQUITA; VINHAS, 2012). É importante enfatizar que as restaurações podem se desprender se não forem realizadas em bordas de esmalte sadio, resultando em repetidas restaurações devido à desintegração do esmalte adjacente ou da presença de esmalte afetado (JEREMIAS et al., 2013).
Diferentemente dos molares, é comum que os incisivos sejam menos afetados, pois não há forças mastigatórias atuando nas áreas de hipomineralização. Portanto, nestes dentes, o tratamento tem finalidade estética, sendo realizados tratamentos de restaurações de resina composta, clareamento dental ou microabrasão (BASSO et al., 2007).
Assim, este estudo objetivou relatar um caso clínico de uma paciente com hipomineralização molar-incisivo. Por esse motivo torna-se importante demonstrar sua etiologia, os aspectos clínicos e as possibilidades de tratamento para pacientes acometidos por HMI.