Resumo
A perda precoce dos dentes decíduos, em especial os anteriores, podem trazer sérias consequências em todo o desenvolvimento da criança. Desde fatores indiretos como psicológicos até fatores diretos como o desenvolvimento da fala e da oclusão.
Lino, em 1994, destaca a influência negativa da ausência dos elementos anteriores na infância, uma vez que a criança se sente diferente, afetando a sua disponibilidade para sorrir e se socializar.
Riekman e Badrawy em 1985 já mostravam a importância dos dentes anteriores ou a reabilitação protética destes para o correto desenvolvimento da fala e dicção na criança, especialmente quando a criança, estiver começando a desenvolver a fala, uma vez que muitos sons são produzidos quando a língua toca a papila palatina por trás dos incisivos superiores e podem ocorrer compensações fonéticas inadequadas na ausência desses dentes. Segundo os autores, se a perda precoce dos incisivos ocorrer antes da criança ter dominado os sons, a ausência dos dentes pode ser um obstáculo na aquisição da habilidade da linguagem correta. Mas se a perda dos dentes ocorrer após o domínio da fala, somente um distúrbio transitório dos sons pode ser aguardado até um período no qual mecanismos compensatórios entrem em ação.
Paixão e Fuziy (2003) alertam sobre a redução do perímetro do arco ou mesmo o simples fechamento do espaço para irrompimento dos elementos permanentes, frente à perda precoce dos seus antecessores decíduos, levando à necessidade de tratamentos ortodônticos mais invasivos posteriormente como expansão dos arcos e tracionamento ortodôntico de elementos permanentes impactados.
Entre as causas da perda precoce dos dentes decíduos, as mais comuns são os traumas dentais, visto o desenvolvimento incompleto da coordenação motora e dos reflexos de proteção (PIASSI et al., 2000), e a cárie dentária. Apesar de a Odontologia moderna estar voltada para os procedimentos preventivos, a cárie dentária ainda constitui um problema frequente na prática clínica e, muitas vezes, é responsável por destruições coronárias extensas levando à necessidade de tratamentos reabilitadores diversos (CARDOSO, 2011).
O período imediatamente após a irrupção do dente e anterior maturação final é o período mais suscetível a lesões de cárie. Assim, em muitas crianças a combinação do dente imaturo recém-irrompido em um meio bucal com microbiota cariogênica e frequente ingestão de carboidratos fermentáveis pode propiciar dentes muito suscetíveis à cárie dentária (ISSÁO, 2013).
É comum observar a ocorrência de cárie dentária severa e de progressão rápida como resultado da alimentação por mamadeira adoçada e a falta de higiene bucal. Crianças de pouca idade podem apresentar os dentes decíduos destruídos de tal forma pelas lesões de cárie que o único tratamento possível é a completa exodontia (OSTENIO, 2009).
A confecção e instalação temporária de aparelhos protéticos totais ou parciais até a irrupção dos dentes permanentes é indicada para perda precoce de dentes decíduos. Esses dispositivos previnem ou reduzem a maloclusão severa na dentição permanente, prevenindo a perda de espaço, distúrbios na fala, restaurando a função mastigatória e minimizando os distúrbios psicológicos causados pela preocupação com a estética, possibilitando ajuste social e emocional da criança (DOMINGUEZ, 2004).
A perda precoce dos elementos decíduos anteriores traz agravantes extras como o comprometimento estético, além das consequências já listadas como a redução do perímetro do arco, fechamento do espaço presente disponível para o correto posicionamento dos elementos permanentes, alterações na fala e a influência negativa no desenvolvimento psicossocial da criança.
O uso de mantenedores de espaço associados à reposição protética, dependendo da idade e da fase de desenvolvimento da criança são de fundamental importância na prevenção dessas consequências (KURUMAE, 2001).
Os dentes decíduos são considerados gerenciadores do posicionamento e alinhamento dos dentes permanentes nas arcadas. A sua manutenção e/ou reabilitação representam fator importante para a manutenção de espaços nas arcadas e orientação para o sentido da erupção dos dentes permanentes. A reabilitação dentária, neste contexto, representa contribuição significativa para prevenção de oclusopatias (CHEDID, 2013).
A reabilitação oral na infância requer um planejamento cuidadoso do caso e normalmente é feito após a remoção de focos de infecção, restaurações, controle de lesões de cárie e instituição de um protocolo preventivo. Deve ser realizado o exame clínico e radiográfico detalhado para que se possa fazer uma avaliação da oclusão, da idade dentária e do ciclo biológico de integridade pulpar. Além disso, a habilidade do profissional e o custo do tratamento também devem ser considerados (CHEDID, 2013).
Os mantenedores podem ser fixos ou removíveis; os primeiros são confeccionados em aço inoxidável e fixados aos dentes e os removíveis são confeccionados em resina acrílica, podendo ter um parafuso expansor, que pode ser periodicamente ajustado. A indicação depende de certos requisitos como quantidade de elementos dentários perdidos, tipo de oclusão dentária, faixa etária do paciente e seu grau de colaboração (BRELAZ, 2016).
Dentre vários tipos de prótese, as mais utilizadas em crianças são as próteses removíveis, e estão clinicamente relacionadas com os aparelhos mantenedores de espaço. Também podem ser utilizadas para corrigir defeitos congênitos, restabelecer estética ou função oclusal e facilitar o desenvolvimento da fala e da mastigação em pré-escolares (AAPD, 2005). Segundo Biancalana (1998), as indicações para colocação de uma prótese parcial removível em crianças incluem a perda precoce de dente decíduo em paciente de pouca idade, no qual, radiograficamente, o germe do dente permanente encontra-se em estágio anterior a 7,5 ou 8 de Nolla.
Segundo Chedid (2013), quando ocorre a perda precoce de dente decíduo na região anterior, está indicado o uso de aparelho removível com dente de estoque. E se o aparelho for permanecer por tempo prolongado, é necessário adaptar um parafuso expansor no aparelho removível, para que ele possa ser ativado, evitando, com isso, restrições ao crescimento transversal da arcada dentária.
Portanto, cabe ao profissional escolher aquela opção de tratamento que melhor devolva a função e estética à criança, respeitando seus limites de aceitação e cooperação e que, ao mesmo tempo, propicie durante a sua realização o máximo de segurança e conforto à criança (CARDOSO, 2001).
Aqui são apresentados dois casos de mantenedores com função também reabilitadora, ambos devido à perda prematura de dentes decíduos anteriores por cárie precoce da infância.
Foi realizada no caso 1 a confecção de mantenedor superior removível confeccionado em resina acrílica, incluída a reposição protética dos dentes 52, 51, 61, 62 em dentes de estoque na cor 60 e instalado grampos na região dos 2º molares decíduos para melhorar a estabilidade do dispositivo.
E no caso 2, um mantenedor fixo na região 52, 51, 61, 62 com dentes de estoque na cor 60. Utilizou-se um arco palatino e tubos na região anterior com conexão a fim de não travar o crescimento da maxila. Foram usadas bandas ortodônticas cimentadas na região do segundo molar decíduo.