Resumo
A paracoccidiodomicose (PCM) é uma infecção fúngica sistêmica causada pelo Paracoccidioides brasiliensis. É uma doença endêmica que representa um sério problema de saúde nos países da América Latina como Brasil, Colômbia, Venezuela e Argentina. No Brasil, é observada em especial nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Essa infecção afeta primariamente os pulmões e é adquirida pela inalação dos micro-organismos. Pode se espalhar para outros órgãos e tecidos, inclusive para a boca (GONDAK, et al., 2012; FRANÇA et al., 2008).
O Paracoccidioides brasiliensis é um fungo dimorfo encontrado no solo e vegetação de áreas geográficas úmidas. A infecção é contraída pela inalação da fase micelial do fungo que, à temperatura do corpo humano, se transforma na forma patogênica de levedura. A inalação por si só leva à infecção, mesmo sem qualquer manifestação ativa da doença. O seu desenvolvimento dependenderá da virulência do microrganismo e dos fatores hormonais, genéticos, nutricionais e imunológicos do hospedeiro. Estima-se que 10 milhões de pessoas são infectadas pelo fungo, mas que apenas 2% desenvolvem a doença (ABREU E SILVA et al., 2013).
O acometimento pulmonar ocorre em 80% a 90% dos casos e a sintomatologia é inespecífica. Os pacientes podem apresentar sintomas semelhantes a um resfriado crônico, expectoração, dispneia, dor torácica, hemoptise, perda de peso, febre, anorexia entre outros. Casos assintomáticos também podem ocorrer (RAMOS-E-SILVA; SARAIVA, 2008).
A classificação clínica inclui as formas aguda/subaguda, crônica e residual (ABREU E SILVA et al., 2013). De acordo com Franco et al. (1987) a forma crônica é a apresentação mais comum da doença. Geralmente afeta adultos, do sexo masculino, de 30 a 50 anos de idade, residentes ou provenientes de áreas rurais e apresenta comprometimento pulmonar, cutâneo e mucoso, que podem ser resultado da reativação de focos latentes do fungo. Acredita-se que essa predileção pelo gênero masculino esteja relacionada com o efeito protetor dos hormônios femininos, que inibem a transformação do fungo para sua forma patogênica (MARTINS et al., 2003). A forma aguda é caracterizada por hepatoesplenomegalia, linfadenopatia e envolvimento da medula óssea. Os pacientes geralmente são mais jovens (abaixo de 30 anos) e ambos os sexos são igualmente afetados. A forma residual inclui sinais e sintomas relacionados a cicatrizes de lesões antigas. A insuficiência pulmonar crônica causada pela fibrose é a sequela mais grave da doença (ABREU E SILVA et al., 2013).
A manifestação bucal é mais comum no palato mole, gengiva, lábio inferior, mucosa bucal e língua, sendo resultante da disseminação hematogênica da doença. A apresentação clínica clássica é hiperplasia, superficialmente ulcerada, com aspecto granular e pontos hemorrágicos, conhecida como estomatite moriforme. As lesões são geralmente acompanhadas de sialorreia, sensação de prurido e ardor, bem como linfadenopatia cervical. Comumente a manifestação bucal é extensa e múltipla. Embora incomum, quando a manifestação bucal é única, o carcinoma epidermoide deve ser incluído no diagnóstico diferencial (GONDAK et al., 2012). A PCM pode resultar na perfuração do palato duro, formando lesões muito dolorosas que, consequentemente, dificultam a deglutição e alimentação. Pode também haver envolvimento periodontal com perda espontânea do dente (FRANÇA et al., 2008).
Uma vez que as infecções por fungos podem ter manifestações clínicas que podem se sobrepor a outras infecções parasitárias ou bacterianas, o diagnóstico correto representa, por vezes, um desafio. Geralmente é feito com base no exame clínico do paciente, radiografias para detectar lesões pulmonares, citologia exfoliativa e biópsia incisional das lesões bucais (RUAS et al., 2016; MARTINS et al., 2003). Como a PCM comumente apresenta quadro de infecção respiratória, radiografias de tórax podem mostrar lesões pulmonares com padrão nodular, infiltrativo, fibroso ou cavitário. A citologia exfoliativa é um método não invasivo e de baixo custo que quando associados ao exame sorológico ou de escarro são conclusivos para o diagnóstico (FRANÇA et al., 2008). Contudo, o exame histopatológico é a principal forma de diagnóstico devido à facilidade de acesso às lesões (ABREU E SILVA et al., 2013). Os brotamentos múltiplos característicos das leveduras constituem o achado microscópico adequado para o diagnóstico definitivo de PCM (NEVILLE, 2009).
O manejo terapêutico da PCM deve obrigatoriamente incluir medidas de suporte às complicações clínicas associadas ao envolvimento de diferentes órgãos pela micose, além da terapêutica antifúngica específica. Os pacientes deverão ser acompanhados periodicamente até a cura. O Paracoccidioides brasiliensis é sensível à maioria das drogas antifúngicas, inclusive aos sulfamídicos. Consequentemente, vários antifúngicos podem ser utilizados para o tratamento desses pacientes, tais como anfotericina B, sulfamídicos e azólicos (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). Para reestabelecimento da saúde geral do paciente, há necessidade de um tratamento multidisciplinar (FRANÇA et al., 2008).