Resumo
A terapia endodôntica prima pela ininterrupta necessidade de manutenção da cadeia asséptica em qualquer fase do tratamento, sob pena de ocorrer insucesso no tratamento do sistema de canais radiculares (GAHYVA; SIQUEIRA JUNIOR, 2001).
Dentes que apresentem grande destruição coronária necessitam de pinos para retenção de restaurações e reabilitações protéticas. Por muitos anos se utilizou pinos metálicos, ligas nobres e não nobres como retenção intrarradicular em dentes tratados endodonticamente (FERNANDES et al., 2003; SORRENTINO et al., 2016). Contudo, pinos de fibra de vidro substituíram recentemente os pinos metálicos, em decorrência de possuírem um módulo de elasticidade próximo da dentina e serem estéticos (LAMICHAME et al., 2014). Pinos pré-fabricados e técnicas com adição de resina composta ao pino de fibra de vidro (pinos anatômicos) foram sugeridas para restaurar canais radiculares enfraquecidos (GOMES et al., 2016; GRANDINI et al., 2003).
Pinos de fibra de vidro possibilitam a reconstrução de dentes com materiais que possuam módulo de elasticidade próximo à dentina. Estes são capazes de fornecer melhor distribuição de forças por meio da estrutura dentária, e na hipótese de possíveis falhas, estas envolvem comumente a interface entre o agente cimentante e a dentina radicular, preservando a raiz dentária. Evidências científicas mostram que há necessidade de remanescente coronário mínimo, denominado de férula, envolvendo a coroa, a fim de garantir melhor equilíbrio das forças, visto que pinos de fibra de vidro não apresentam a mesma adaptação que núcleos metálicos fundidos na região cervical. Requisitos para a instalação de pinos de fibra de vidro, como: presença de férula, remanescente suficiente de material obturador e ausência de espaços vazios entre o material obturador e o pino (BUENO et al., 2017).
A complexidade anatômica intrarradicular aliada às limitações das propriedades físico-químicas dos materiais adesivos tornam o processo de união desafiador. A tensão gerada pela contração de polimerização intensifica-se no espaço intrarradicular devido ao fator de configuração cavitária ou fator “C”, que se refere à proporção entre as paredes aderidas e não aderidas do substrato dental à resina. Durante a polimerização, as superfícies não aderidas permitem ao material fluir nos estágios iniciais e aliviar a tensão proveniente da contração de polimerização (RUEGGEBER; CAUGHMAN, 1993).
Há diferenças estruturais e composicionais com relação à dentina coronária. Em áreas apicais a dentina se torna esclerótica e apresenta túbulos dentinários de menor diâmetro, obliterados por minerais, fato este que também pode limitar a adesão dentinária. A smear layer produzida dentro dos canais tem espessura e densidade diferentes daquelas observadas na dentina coronária, sendo a remoção desta imperativa para que os procedimentos adesivos sejam efetivos (FARIA et al., 2013).
A odontologia digital e o avanço de técnicas de fresagem CAD-CAM resultou em um sistema de alta precisão, eficiência e exatidão em tempo de processamento reduzido e diminuição das taxas de erro de fabricação (MIYAZAKI et al., 2009). Portanto, usando a tecnologia CAD-CAM podemos produzir a parte intrarradicular personalizada, considerando uma opção viável, principalmente a possibilidade de fresar o pino e o núcleo, o que elimina a necessidade de resina composta para formar o núcleo de resina (LIU et al., 2010).
Fabricação de pinos de fibra de vidro personalizados com fresagem no CAD-CAM tem vantagens. Esse processo permite uma camada de cimento mínima, simplificando a técnica e reduzindo etapas clínicas, pois elimina a necessidade de aderir resina composta para construir um núcleo adequado para auxiliar na manutenção da restauração, criando um sistema retentor intrarradicular em monocamada (LIU et al., 2010).
O desenvolvimento de cimentos autoadesivos trouxe uma nova perspectiva à cimentação de pinos estéticos. Estes cimentos não requerem o condicionamento dentinário, nem a aplicação de sistemas adesivos isoladamente, reduzindo o número de passos clínicos. O mecanismo dos cimentos autoadesivos fundamentam em uma interação química com a hidroxiapatita. Os átomos de cálcio presentes na hidroxiapatita agem como receptores de elétrons, promovendo a união química entre os monômeros ácidos do cimento e os tecidos dentais, resultando na formação de fosfatos de cálcio. Estes cimentos apresentam habilidade limitada de desmineralizar ou dissolver a smear layer e interagir com a dentina subjacente, promovendo união superficial (BUENO et al., 2017).
Uma vantagem atribuída a esse material é a alta tolerância à umidade. Forma-se água durante a reação de neutralização dos ésteres de fosfato com a hidroxiapatita. A água formada favorece a interação entre cimento e o substrato dentinário (DE MUNK et al., 2005).
Durante o preparo para pino de fibra de vidro, deve-se manter um remanescente mínimo de material obturador de 5 mm, a fim de fornecer selamento adequado na porção apical do canal, rica em canais laterais e deltas apicais, para que o reparo periapical possa ocorrer e ser mantido. Do ponto de vista mecânico, dependendo do grupo dental, a implantação radicular de pino deve ser equivalente ao comprimento da coroa. Esse critério deve ser aplicado principalmente em dentes anteriores e pré-molares, devido às forças a que tais dentes são submetidos durante a mastigação. Durante o preparo deve-se realizar irrigação contínua com soro fisiológico para a remoção de resíduos de material obturador e da smear layer oriunda do procedimento (BUENO et al., 2017).