Resumo
Recessão gengival é definida como o deslocamento da margem gengival para uma posição apical à junção cemento-esmalte (JCE) (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 2001).
A exposição radicular ocasionada pela recessão gengival pode gerar comprometimento estético, hipersensibilidade dental e cárie radicular. Diversos fatores de riscos podem estar associados à ocorrência e progressão da recessão gengival, incluindo o acúmulo de biofilme dental e consequente inflamação gengival, a presença de deiscências e fenestrações ósseas, componentes da aparelhagem ortodôntica fixa, oclusão traumatogênica, escovação dentária traumática, inserção alterada do freio labial e bridas musculares, mau posicionamento dental, pouca espessura e largura da faixa de gengiva queratinizada e pouca espessura do tecido ósseo alveolar adjacente (TRENTINI et al., 1995; SANDERS, 1999; YARED; ZENOBIO; PACHECO, 2006; LOPEZ, 2013).
Outro fator etiológico provável é o movimento ortodôntico dos dentes para fora do processo alveolar, principalmente dos incisivos, que pode estar associado a uma maior tendência para o desenvolvimento das recessões gengivais (JOSS-VASSALLI et al., 2010).
Rios et al. (2014), em estudo realizado com uma amostra representativa de 1.023 adultos com 35 anos ou mais, demonstraram ser alta a prevalência de recessão gengival nos grupos avaliados, na ordem de 75,4% de indivíduos afetados com recessões iguais ou maiores que 3 mm e 40,7% com recessões iguais ou maiores que 5 mm, sendo que os incisivos centrais inferiores, seguidos dos segundos pré-molares inferiores e dos primeiros molares superiores foram os dentes mais afetados. Constataram também que o aumento da idade, sexo masculino, tabagismo, higiene bucal deficiente, histórico de tratamento periodontal e alta porcentagem de cálculo estavam associados à progressão das recessões.
Os procedimentos de cobertura radicular visam não apenas melhorar a estética, mas também aumentar a espessura e largura da faixa de gengiva queratinizada para facilitar o controle do biofilme dental e prevenir a periodontite e a cárie radicular (WENNSTRÖM, 1996).
Diversas técnicas de cirurgia mucogengival foram propostas para o tratamento das recessões gengivais unitárias e múltiplas, visando deter a progressão da lesão e recobrir as superfícies radiculares desnudadas, com diferentes tipos e desenhos de incisões, utilizando ou não enxertos de tecido conjuntivo subepitelial (ETCSE). Não importando a técnica utilizada, o sucesso clínico do recobrimento radicular é definido pelo recobrimento total da superfície radicular, profundidade de sondagem resultante inferior a 3 mm, ausência de inflamação gengival e coloração e volume de tecido compatível com as áreas adjacentes (MILLER, 1994; PRATO; CLAUSER; CORTELLINI, 1995).
Em termos de recobrimento radicular, aumento de tecido gengival queratinizado e estabilidade tecidual em longo prazo, o uso do ETCSE tem sido considerado padrão-ouro no tratamento das recessões gengivais do tipo Classe I e II de Miller, tanto unitárias quanto múltiplas (MILLER, 1985; CHAMBRONE et al., 2008; CHAMBRONE; TATAKIS, 2015).
Para o tratamento de recessões unitárias moderadas de 4 a 6 mm de profundidade, Joly, Carvalho e Silva (2015) indicam a técnica do retalho colocado em “L”, a do retalho colocado coronal modificado ou a técnica do envelope modificado com aproximação apical que foi originalmente descrita por eles. Para as recessões unitárias e profundas, maiores que 6 mm, elegem a técnica clássica do retalho colocado coronal, desde que haja a presença de um vestíbulo profundo, ou o retalho colocado lateral dependendo da localização do defeito e presença de boa quantidade e espessura de tecido queratinizado adjacente ao defeito. Contudo, para a região anterior da mandíbula, onde a pouca profundidade do vestíbulo bucal pode provocar uma maior tensão tecidual, reduzindo a vascularização ou levando a uma maior exposição do enxerto e com isso ocasionando necrose do mesmo, indicam a técnica do envelope modificado com aproximação apical.
A técnica original do envelope (RAETZKE, 1985) consiste na realização de um retalho de espessura parcial sem a inclusão das papilas, sucedido da incorporação do ETCSE que fica parcialmente exposto. A modificação da técnica prevê a realização de um retalho misto, partindo do preparo de um envelope total com o uso de tunelizadores próximos à margem gengival, seguido da divisão apical do retalho a partir da linha mucogengival para garantir sua mobilização coronal. Posteriormente, o ETCSE é posicionado e estabilizado ao retalho vestibular com suturas. Na técnica do envelope modificado com aproximação apical, além das modificações previstas, é sugerida a realização de sutura na porção mais apical da recessão, visando à aproximação das bordas para que haja redução da área avascular, possibilitando a acomodação do enxerto, sem exposição excessiva deste.
O presente trabalho teve por objetivo relatar o caso clínico no qual uma recessão gengival mandibular unitária e profunda foi tratada por meio do uso da técnica do envelope modificado com aproximação apical com proservação de 12 meses.